27.9.08

Mais um poquinho...

Bem, no texto anterior eu disse que o desenvolvimento de computadores que possam reproduzir a inteligência humana depende do conhecimento que o homem possui da própria mente, e que algumas tentativas de entendimento da relação entre cérebro, mente e componentes eletrônicos estão sendo feitas com o auxílio de alguns filósofos.

Mais: destaquei o texto de um deles, John Searle, e apresentei um de seus exemplos: uma possibilidade da substituição de partes do cérebro por chips de computadores. No exemplo, isto acontecia sem a perda daquilo que chamamos de mente, ou seja, aquilo que nos diz o que e quem somos e estabelece uma relação entre nós e o nosso mundo exterior, o que nos informa sobre a existência do nosso pensamento e nos diferencia de outros homens ou outros seres vivos.

Tudo naquele paradigma se mostrava simples: sim, era possível a troca de partes do cérebro por elementos de outra ordem, ao contrário do que mostraremos hoje. Vamos ao texto, lembrando que estamos falando de um cérebro com problemas, e que começa a ter as suas partes substituídas por circuitos integrados:

“... à medida em que o silício é progressivamente implantado dentro de seu cérebro em degeneração, você nota que a área de sua experiência consciente está se reduzindo, mas que isso não apresenta nenhum efeito em seu pensamento exterior. Você percebe, para seu completo espanto, que está perdendo o controle de seu comportamento exterior.

Nota, por exemplo, que, quando médicos testam a sua visão, ouve-os dizer: “Estamos exibindo um objeto vermelho na sua frente: por favor, diga-nos o que você vê”. Você quer gritar: “Não enxergo nada.

Estou ficando totalmente cego”, mas ouve sua voz dizer de uma maneira que lhe foge totalmente ao controle: “Vejo um objeto vermelho na minha frente. Se levarmos este experimento... ao extremo, obteremos um resultado muito mais deprimente do que o do primeiro. Você imagina que sua experiência consciente se reduz lentamente a nada, enquanto seu comportamento externamente observável permanece o mesmo.”


O que o texto narra aqui é algo extremamente angustiante. Aliás, das coisas mais angustiantes as quais podemos pensar: o seu corpo começará a responder aos diferentes estímulos externos, mas a sua consciência, a sua mente, começará a desaparecer. Você passará, a partir de um certo momento, a ser algo que vive, responde a perguntas, dirige, trabalha, mas que não tem consciência de nada disso, funcionando como uma máquina*.

Neste ponto então, em que a substituição neuronal não parece ser possível, é que se encontra o que podemos de denominar de um segundo nível da questão levantada pelo texto de Searle: uma máquina que pense, que tenha uma inteligência artificial, tem que ser capaz de ter consciência de sua própria existência, de aprender a se questionar, de fazer perguntas a si mesma, ter dúvidas, e não apenas responder a estímulos externos.

É assim que se comportam os robôs dos filmes de ficção científica dos quais falamos anteriormente, não é? Mas então: isto um dia será mesmo possível? E como ficaria a situação do homem com cérebro de silício?

Amanhã eu digo como o filósofo sobre o qual estamos tratando responde a esta pergunta, além da posição de outros filósofos e cientistas, e ainda: onde se encontram os principais centros de pesquisa sobre Inteligência Artificial no mundo.

P.S - Sobre o * acima: O que se propõe neste momento, e que é algo que já possui certa história na filosofia, na psicologia e na psicanálise, é a relação entre consciência e comportamento. Ainda que fique claro o fato de não haver uma relação total de dependência, paridade mesmo, entre as duas coisas, é nesta relação que se baseia o behaviorismo, radical ou não. Como, então, levar fé numa corrente destas, que faz tanto sucesso em nosso tempo e que se acredita a melhor das psicologias possíveis?

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