23.7.08

As férias, o coma-andante, o pão e o sistema educacional

Para quem ainda não viu, há ali no canto direito do blog, um pouco abaixo, na categoria "Merecem uma visita", um link chamado "Um blog direto de Cuba". Acredito já ter feito um comentário sobre ele. Convido-os novamente para que visitem. Os textos são deliciosos, perspicazes, e nos ajudam a entender o tom das coisas na ilha. Reproduzo aqui um deles, mostrando todos os desvãos e angústias de uma mãe cubana, além da imagem do tal "diploma".

Termina el curso escolar y ya veo peligrar mi pan del racionamiento. Mi hijo estará durante dos meses sin ir a la escuela y, en la ansiedad de las vacaciones, podría comerse hasta las bisagras de las puertas. No se conformará con el harinoso ejemplar de 80 gramos que recibe por la libreta y de seguro arremete contra mi cuota de pan o la de su papá.

Me preparo desde ahora para las preguntas del tipo ¿Mami, no vamos a visitar a la familia de Camagüey? y yo intentando explicarle que la cola para los ómnibus interprovinciales demora tres días y ya están vendiendo los pasajes para la segunda quincena de julio. Tampoco lo calmará saber que los precios de moverse en las estrechas Yutong, hacia el centro de la Isla, vienen a ser la mitad del salario de cualquier trabajador.

Pero trataré de complacerlo y le cederé mi pan, dormiré tres días en la fila por un pasaje a Camagüey y hasta puede que le alquile un par de horas el Play Station de un vecino. Todo eso porque ha terminado séptimo grado con buenas notas y hay que agasajarlo. El sábado pasado fue el acto de fin de curso y regresó a casa con su diploma y lanzó su grito de guerra desde la puerta “¡Estoy de vacaciones!”.

Sólo que no sé bien de qué se ha graduado mi hijo, si de séptimo grado o de la Escuela del Partido Comunista “Ñico López”. La confusión ha comenzado cuando miré el diploma, que aquí les dejo para que puedan comprobar de dónde viene mi desconcierto. ¿Qué creen ustedes?


20.7.08

cris-gris

Respondendo à minha amiga Cris: o Paulo Roberto Martins eu não conheço, nunca tinha ouvido falar. Já o Laymert Garcia dos Santos foi meu professor em um curso que fiz na economia e no qual, aliás, lemos Marx. Posso dizer que é um ótimo professor, ótimo mesmo, com uma leitura interessante e menos ideológica do marxismo.

Não sei ainda o motivo da pergunta, mas se eles acreditam que a ciência é uma questão que se resolve também no campo da política e da ética, melhor. Se não, não posso fazer nada, hehe.

Aliás, há algumas coisas a serem ditas sobre isso. Ficam para o próximo post.

19.7.08

Tentativa de conforto para blogueiras que escrevem sobre avós


Mixwit

SBPC: Sociedade de Bundinhas e Petralhas Comunas

Hoje visitei rapidamente a SBPC. Como tinha que tratar do meu reingresso a fim integralizar a licenciatura, aproveitei e fui dar uma olhada. Resultado: depois as pessoas se perguntam porque é que Wittegenstein foi ser porteiro e jardineiro na Áustria e Nietzsche decidiu ser enfermeiro na guerra franco-prussiana. Aquilo é uma chatice só, uma chatice ditada por um agenda no mínimo estúpida.

Do lado de fora, milhões de camisetas do Che e um pessoal vendendo um jornaleco comunista. Olha o que esse povo dizia: que não temos que deixar de acreditar na revolução, e que o neoliberalismo do governo FHC blá blá blá blá blá blá... Se eu estivesse irritado iria arrumar uma confusão, botar fogo naquela merda toda, fazer a barba de todo mundo, trocar os bonezinhos de anarquista por viseiras, arrumar emprego de verdade pra galera (quem sabe guardar os carros), além de arrumar análise coletiva, pra ver se esse povo sai da tal "infância do pensamento". Se o Getúlio estivesse lá, no mínimo umas bicudas sairiam (putz cara, agora não dá mais).

A princípio, fiquei com vergonha de pertencer às tais ciências humanas. Putz, os caras ali dentro falando de ciência, e os coiós aqui querendo fazer a revolução: nem ler um autor tosco como Marx os caras conseguem, e os outros falando de luz síncrotron. Ora, ora, Fabiano tolinho. Bastaram 20min na tenda e mais um tanto na ginásio para ver claramente que a agenda do povo exato era ditada pelo lado jacu do povo das humanas.

Sim, eu li Nietzsche, eu li Adorno e Horkheimer, eu li Habermas: técnica e ciência como ideologia, eu já sabia. Mas tudo ficou muito claro naquele momento. Como um pensamento de fundo tão despreparado pode ditar caminhos para uma quantidade gigantesca de pesquisas? Parecia um encontro de ONG´s dispostas a salvar a tartaruguinha caolha e barrabenta de Mossoró: caceta!

É impressionante como a extrema tecnicização das ciências exatas acabou produzindo indivíduos que não fazem a mínima idéia de seus lugares no mundo, quiçá o de suas pesquisas. O ditame é fornecido pelo levante do interesse geral e, por assim, pela boniteza do ato científico. Se ele é capaz de emocionar as pessoas, de fazê-las suspirarem, é algo que deve ser pensado. Um exemplo? O nome do projeto que ganhou o prêmio cientistas do amanhã: Teste de disponibilização da produção do biodiesel para pequenos produtores de forma artesanal através de gordura animal. E bota o MST pra produzir biodiesel, hahaha... Só não pensaram no fato de que agora não é mais in comer animais.

Outros ganhadores:

Microbiologia Democrática - das gêmeas Ana Cláudia e Ana Clara Cassanti – Trata do ensino da microbiologia a partir de experimentos e jogos para escolas que não possuem laboratório.

Parâmetros analisados da água de Londrina após a utilização e tratamento de esgoto - Júlia Carvalho (Londrina) – Análise de parâmetros e conscientização da importância dos rios. Integra o projeto da prefeitura de Londrina “O rio da minha rua”.


Enquanto isso os jovens do resto do mundo desenvolvem Napsters, criam formas de aproveitamento de água salgada e barateiam diversas formas de tecnologia, "democratizando-as".

Confundimos ciência e tecnologia com educação básica e projetos sociais caducos: alguém aí quer algo mais alinhado com o fato de sermos um país quem tem um presidente apedeuta e aético, e ainda se orgulha disso?

Infelizmente, esta é a nossa Weltanschauung.

18.7.08

Loro Beto Conte, o meu irmão verde

Como alguns de vocês sabem, eu tenho um papagaio. O nome dele é Loro Roberto Conte, vulgo Loro Beto.

Loro Beto tem 39 anos e fala pouquíssimas coisas. Ele é bom mesmo é de imitar sons: cachorro grande, cachorro pequeno, ronco, falatório e tosse. É só meu avô abrir a porta do quarto que ele começa a tossir, sacaneando. Já avisei que qualquer dia desses ele leva uma porrada. Claro que não adiantou.

Escrevo sobre ele hoje por um motivo estranho: Loro Beto está se humanizando. Sim, senhores: Loro Beto acha que é uma pessoa, e não vejo mais motivos para que não seja considerado como tal. Tudo começou quando minha mãe, acho que porque fui morar fora, resolveu substituir o filho.

Com isso, Loro Beto começou a ficar na sala, a almoçar com a família, a dormir quase no quarto. A situação, na verdade, é a seguinte: quando minha mãe acorda, pega o Loro e o coloca na sala. Lá ele assiste à Ana Maria Braga e aos desenhos globais. Enquanto faz isso, ganha um naco de pão e meia banana de café da manhã. Como já disse, almoça conosco, o que inclui comer macarrão, arroz, e até batata frita.

Aliás, a questão “alimentação” é um caso à parte: já disse que deve ser o primeiro caso de colesterol alto e, por conseguinte, infarto, da história dos papagaios. Ele é vidrado por: Fandangos, pizza, macarrão, pão, pastel, esfirra do Habib’s e qualquer outra junkie food que você coma na frente dele. Se você não dá, ele berra. Simples.

A única coisa ligada à natureza que Loro Beto faz é dar umas voltas na árvore que há no meu quintal no finalzinho da tarde. Às 18h ele é colocado de novo na cozinha, para o lanche-jantar, e depois volta para a sala, para assistir às novelas. E quando volta para a sala, há um porém: considere que a gaiola é colocada em frente ao sofá, o que faz com que ocupe uma posição no móvel, o que lhe dá, logo, o status de membro da família.

Acredito que chegue o momento no qual Loro Beto começará a usar o vaso sanitário e fuçar aqui no micro. Talvez eu tente um RG e um CPF. Se eu desse à Aristóteles as características psicológicas do Loro, ele teria que admitir que existem, sim, pessoas verdes e com penas.

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Devo achar que é sorte o fato do Loro estar se humanizando. O meu mais novo vizinho também tem um papagaio, só que lá a coisa parece estar se invertendo: a pessoas estão de papagaizando. As ouço, constantemente, passar pelo corredor falando assim: perau folitó perstiraolhaquibo fortlastes pricaranha uergranamas... sendo que o papagaio lhes responde na mesma língua papagaiesa. Estou prestes a chamar o IBAMA.

Ah, esta é pra você!


Mixwit

13.7.08

Ai que chatice!

“Levanto-me quando os cabelos brancos de V. Exa. passam diante de mim. Mas o travesso cérebro que está debaixo e as garridas e pequeninas coisas que saem dele, confesso, não me merecem nem admiração nem respeito, nem ainda estima. A futilidade num velho desgosta-me tanto como a gravidade numa criança. V.Exa. precisa menos cinqüenta anos de idade, ou então mais cinqüenta de reflexão."

Adoro este texto acima. Foi escrito pelo poeta lusitano Antero de Quental (1842-1891) para alfinetar um outro poeta, Antônio Feliciano de Castilho (1800-1875).

Primeiro, o que se vê é muita ironia. E depois, uma infeliz verdade. Que chatice é uma criança querendo se passar por adulto. Que horrendo é um velhinho dando uma de bacana. Os dois são espetáculo fácil na TV. Carregam o tom do inusitado, do diferente, do bom. O que haverá de bom nisso? Pra mim é só tolice.

E vem o menininho de 8 anos falar de política, de economia, de religião. E vem o velhinho dar cambalhotas, tocar bumbo e jogar bola com sua roupa brilhante.

Ambos vindo do campo dos horrores como a mulher barbada, o homem elástico, os anões siameses.

Tudo até que suportável se o horror não tivesse hoje se transformado em objetivo cultural, virado moda.

- Vai Pedrinho, analisa a queda do Renan Calheiros.

- Aí bisavô, me empresta essa regata colada e os alteres.

Hummm, e eu tranco as portas para o mundo. Hummm, e eu dou uma de Antero de Quental. Menos idade ou menos reflexão pra mim? Ainda não sei, mas tirem estes moleques logo da minha frente pelo amor de Deus!

4.7.08

Lições sobre morte e imortalidade

Então povo: segundo meu avô, que por conta do fato acendeu uma vela e quase pôs fogo na casa, ontem fez 17 anos que minha avó morreu. Estranho pensar que agora, aos 33, posso dizer que passei mais da metade da vida sem a presença física daquela que me foi a principal referência. Física digo não porque acredite em espíritos, mas porque a memória vai-se esvaindo e por vezes fica só o principal, só a estrutura, uma lembrança boa que é quase um lapso. Se eu fosse uma fenomenólogo, talvez tivesse mais coisas a dizer sobre isso. Como não... vai um texto que escrevi há um tempinho atrás.

Beijos vó...



Ontem choveu granizo. E granizo me lembra Dona Elza, a avó que me colocava sobre a mesa antes do almoço pra fritar bifes de fígado que segundo ela me tornariam mais forte. A avó que que me colocava sobre a mesa durante a tarde pra fazer bolinhos de chuva em formato de charutos, aqueles que tinham um sabor diferente e os quais nunca mais vou voltar a comer na minha vida. A avó que fazia jarros e jarros de suco de laranja.

Dona Elza foi-se cedo. Acho que com 63 anos. A reincidência de um tumor a levou. Da primeira vez que ficou doente passei meses na cama ao seu lado. Da segunda, tinha tanto medo que ela se fosse que não conseguia vê-la. Arrependo-me por isso.

Dona Elza foi a pessoa mais importante da minha infância. Filha de um português e de uma espanhola, tinha o carisma de um e a força do outro. Era viva, inteligente, irônica, engraçada, esplendorosa e linda. Fazia amigos como quem troca de meias. Ainda sou parado nas ruas por quem, como eu, sente saudades dela.

Sempre que chovia granizo, corríamos pra porta da cozinha pra pegar algumas pedras. Segundo ela, gelo celeste faz bem à pele. Passávamos aquilo no rosto, morríamos de rir, e voltávamos pra sala.

Fazemos isso até hoje, só que agora com o João junto. Devo acreditar que a coisa funciona. Quando ela morreu parecia ter 40 anos, ou 35. Não se encontrava uma ruga no rosto risonho.

Da última vez que a vi, algumas horas antes de ir, num quarto de hospital, com sede e sem poder se alimentar, disse que quando sairia dali tomaria um balde de laranjada e enfiaria um sorvete na testa pra que ele escorresse até a boca. Não deu.

Entretanto, toda vez que chove granizo passamos umas pedras no rosto e ela insiste em colocar umas na boca. Digo a ela que faz mal. Dona Elza não liga, ela é teimosa, e voltamos pra sala, agora os três, rindo à toa.