31.7.09

Cinco poemas concretos

"Cinco" (de José Lino Grunewald, 1964),
"Velocidade" (de Ronald Azeredo, 1957),
"Cidade" (de Augusto de Campos, 1963),
"Pêndulo" (de E.M. de Melo e Castro, 1961/62)
e "O Organismo" (de Décio Pignatari, 1960), pois hoje é dia daquilo que o organismo quer.

21.7.09

Rasidão; ainda

A rasidão não é algo que aparece de surpresa. Assim como um balde furado se esvazia, uma piscina se esvazia, uma latrina se esvazia, você também é capaz de esvaziar-se. E mais: assim como os objetos citados, você não tem a mínima consciência de estar a perder algo. A sua, ou a nossa diferença para com os baldes e as piscinas e as latrinas se dá apenas quando a coisa já se perdeu, esvaiu-se, morteceu.

Quando este ponto é chegado, a renitência das coisas diárias força o surgimento de uma consciência que é trazida de fora. O que se exige não encontra onde nadar, se angustia e se bate, bate em você, que sufoca e só então repara.

Só poder reproduzir automatismos é um dos primeiros sinaisintomas da rasidão. Ele não dói, não pode ser percebido comportamentalmente e, portanto, não exige, segundo as psicologias ditas eficazes, remédios ou terapias.

Já o segundo sinalsintoma da rasidão machuca bastante, muito. É quando ela se torna reflexiva, ou seja, você reconhece com todos os pregos, arames farpados, agulhas, alfinetes e lanças que são inerentes ao reconhecer, que perdeu a manivela do ímpeto.

E o que sou eu sem alavanca? Boçal, é mais do que provável.

Um rato.

Uma semilatrina, um semibalde, uma semipiscina.

A rasidão impede, dentre todas as outras isquemias geradas, que se articule o suficiente a seu respeito.

P.S - Ela pode durar mais do que se imagina.

18.7.09

Bleuler em Brasília

Existe aquela seriíssima teoria a respeito da criação literária que diz o seguinte: se o realismo fantástico não fez muito sucesso no Brasil enquanto forma de expressão, isso se deu justamente por conta de nossa capacidade ímpar de produzir bizarrices no mundo real.

Quando vejo a figura de Lula, toda vez que ouço ou leio a respeito das coisas que ele diz, essa teoria me vem à cabeça. Deve acontecer com a maior parte das pessoas, mas devo admitir que em mim a coisa tem ganho um caráter tamanho que não consigo mais, sequer, classificar o que se passa em termos de intuição ou percepção: insólito, absurdo, insano, esquizofrênico - nada é capaz de traduzir aquela coceira no córtex que sinto quando entram por meus tímpanos as declarações psicóticas de nosso presidente; e aqui não exagero. O universo de Lula é absolutamente descolado de qualquer evento exterior à sua presunção, e as falas que se geram deste estado têm, há muito, extrapolado qualquer tipo de verificação, seja ela estatística ou ética.

Acredito que algumas coisas devam ser ditas a este respeito; coisas que, como veremos, acabarão dando em outro lugar. Mas vamos lá.

Primeiro - parece não haver mais necessidade alguma de que os números que Lula informa em suas aparições se liguem a tabelas de um instituto qualquer, sejam algum dado sério e/ou que tenham vindo de um lugar a partir do qual eles se justifiquem: a única necessidade é de que eles possuam, à moda dos alienados, uma existência mental, que tenham se gestado na cachola do homem. E só. É esta a metodologia do DataLula. Do PAC – que praticamente não existe – à extração do petróleo, há pouquíssimos dados que correspondam à realidade, por mais que esta possa ser recriada.

Segundo - a quantidade de absurdos morais que este homem tem dito e com o assente de todos, inclusive daqueles que são ultrajados, não é normal. Para ficarmos apenas nos últimos exemplos, citarei cinco falas, as mais graves, sendo que mais tarde voltarei à terceira:

a) Lá (nos EUA), ela é um tsunami; aqui, se ela chegar, vai chegar uma marolinha que não dá nem para esquiar.
b) Um país que acha petróleo a seis mil metros de profundidade pode achar um avião a dois mil.
c) Eu não conheço ninguém, a não ser a oposição, que tenha discordado da eleição do Irã. Não tem número, não tem prova. Por enquanto, é apenas, sabe, uma coisa entre flamenguistas e vascaínos.
d) Tem uma, duas ou três denúncias em fase de apuração. Apura-se e toma-se as medidas. O que não pode é um país com tantas coisas importantes como o Brasil ficar discutindo coisas menores que o Tribunal de Contas [da União] pode investigar.
e) Depende. Todos eles são bons pizzaiolos.

Pensem com carinho em cada linha destas aí. É preciso estômago para suportá-las sem uma estremecida.

Terceiro – há uma brincadeira que todos conhecemos que é a seguinte: quando dizemos que alguém está louco, logo em seguida soltamos um – o médico falou que é para não contrariar! Pois então: o que há com Lula é que, a partir do óbvio momento em que todas as suas excentricidades descompassadas são deixadas para lá, atravessam a linha que deveria contê-las e se tornam ululâncias. Cada criação despreocupada ou mesmo indecente, quando afirmada pelo universo exterior, ganha o carimbo da realidade. E assim Lula vive e caminha em seu País das Maravilhas, enquanto que a maioria esquece de se perguntar: qual é a função de um presidente, mesmo?

Quarto – quem captou esta composição toda de forma esplendorosa e vem sabendo dela se aproveitar foi Barack Obama e sua equipe. Mais do que qualquer outra coisa, Obama percebeu que Lula adora ser adulado, que adora ser reafirmado, e que acaso necessite jogar com o Brasil, seja de qual maneira for, tudo deve se iniciar no fortalecimento da alucinação lulista. É como se dissesse: “Vai aí falando suas bobalhadas, meu amigo, porque internacionalmente elas não fazem efeito, mesmo. Mas você é um grande líder, uma cabeça pensante e eu te admiro, muito. Cof... Cof...”. E então lemos os jornais e nos sentimos felizes, sorrimos marotamente e achamos bonito: um se ilude, o outro afirma a ilusão para dela tirar proveito e nós, que adoramos os dois sujeitos, que os vemos como os supra-sumos da pureza da alma, nos regozijamos; além de exercemos, é claro, a nossa bocozisse com a coisa estrangeira, jacus que somos.


Continua...

para o sábado, uma galáxia haroldiana

reza calla y trabaja em um muro de granada trabaja y calla y reza y calla y trabaja y reza em granada um muro da casa del chapiz ningún holgazán ganará el cielo olhando para baixo um muro interno la educación es obra de todos ave maria em granada mirad en su granada e aquele dia a casa del chapiz deserta nenhum arabista para os arabescos uma mulher cuidando de uma criança por trás de uma porta baixa y reza y trabaja y calla não sabia de nada y trabaja não podia informar sobre nada y reza e depois a plazuela san nicolás o branco do branco do branco y calla no branco no branco no branco a cal um enxame de branco o branco um enxame de cal pedras redondas do calçamento e o arco branco contendo o branco a cal calla e o branco trabalha um muro de alvura e adiante no longe lálonge o perfil vermelho do generalife e a alhambra a plazuela branca contendo-se contendo-se como um grito de cal e o generalife e a alhambra vermelhos entre ciprestes negros cariz mudéjar de granada e agora o cármene de priestley carros parando los guardias civiles o embaixador inglês fazendo turismo entre as galas do caudillo e do cármene de priestley sai priestley ou poderia ser para recebê-lo aparato de viaturas escandalizando a cal calada o embaixador de sua majestade britânica visita um patrício em granada crianças correndo fugindo para os vãos das portas e o branco violado a medula do branco ferida a fúria a alvúria do branco refluída sobre si mesma plazuela san nicolás já não mais o que fora o que era há dois minutos já rompido o sigilo do branco arisco árido do cálcio branco da cal que calla y trabaja y estamos sentados sobre un volcán dissera o chofer no pátio da cartuja sentados no pátio da alhambra bautizada sob o sol da tarde esperando que abrissem um vulcão coração batendo em granada e por isso no muro reza trabaja y calla san bernardo religión y pátria e de novo o albaicín com seus cármenes y glorietas o albaicín despencando de centenas de miradouros minúsculos sobre a vista da alhambra e do generalife vermelho recortado de negro escarlate cambiando em ouro o sol mouro os muros mauros de granada mas o silêncio na plazuela ou plazeta san nicolás rompido para sempre um minuto para sempre nunca mais a calma cal a calma cal calada do primeiro momento do primeiro branco assomado e assomando nos lançando catapulta de alvura alba-candidíssima mola de brancura nos jogando branquíssima elástico de candura nos alvíssimo atirando contra o horizonte rojonegro patamar de outro horizonte o semprencanecido esfumadonevado da sierra nevada agora escrevo agora a visão é papel e tinta sobre o papel o branco é papel yeserías atauriques y mocárabes de papel não devolvem senão a cuncula do tempo a lúnula da unha do tempo e por isso escrevo e por isso escravo roo a unha do tempo até o sabugo até o refugo até o sugo e não revogo a patina de papel a pevide de papel a cascara de papel a cortiça de papel que envolve o coração carnado de granada onde um vulcão sentados sobre explode e por isso calla y por eso trabaja y por eso

17.7.09

You've got to hide your love away

Cheguei agora em casa. Estou comendo bolacha água e sal com requeijão e geléia de damasco, a atual configuaração do meu TOC. Saí com um grande amigo, daqueles que moram bem lá no fundo. Nós divertimos bastante, discutimos até sobre etologia, e ouvimos esta música na volta pra casa. Eu disse que não sairia do carro enquanto o refrão não viesse. Isto pode ficar .

2.7.09

fabianescas

Ter no avô a pessoa mais Agenda 21 que se conhece. Depois de assassinar a árvore que fica em frente de casa porque dela caíam muitas folhas - o que também conferiu um visual Addams à nossa residência -, agora ele descobriu uma maneira por demais eficiente para secar a toalha no inverno: liga o carro, espera o motor esquentar e coloca a dita sobre o capô. Fica seca e quentinha, segundo ele.

E assim segue o Brudtland do Parque Industrial...