Numa democracia, nenhum dos Poderes é soberano. Soberana é a Constituição, pois é ela quem dá corpo e alma à soberania do povo.
Acima dos políticos estão as instituições, pilares do regime democrático. Hoje, no Brasil, inconformados com a democracia representativa se organizam no governo para solapar o regime democrático.
É intolerável assistir ao uso de órgãos do Estado como extensão de um partido político, máquina de violação de sigilos e de agressão a direitos individuais.
É inaceitável que militantes partidários tenham convertido órgãos da administração direta, empresas estatais e fundos de pensão em centros de produção de dossiês contra adversários políticos.
É lamentável que o Presidente esconda no governo que vemos o governo que não vemos, no qual as relações de compadrio e da fisiologia, quando não escandalosamente familiares, arbitram os altos interesses do país, negando-se a qualquer controle.
É inconcebível que uma das mais importantes democracias do mundo seja assombrada por uma forma de autoritarismo hipócrita, que, na certeza da impunidade, já não se preocupa mais em valorizar a honestidade.
É constrangedor que o Presidente não entenda que o seu cargo deve ser exercido em sua plenitude nas vinte e quatro horas do dia. Não há “depois do expediente” para um Chefe de Estado. É constrangedor também que ele não tenha a compostura de separar o homem de Estado do homem de partido, pondo-se a aviltar os seus adversários políticos com linguagem inaceitável, incompatível com o decoro do cargo, numa manifestação escancarada de abuso de poder político e de uso da máquina oficial em favor de uma candidatura. Ele não vê no “outro” um adversário que deve ser vencido segundo regras, mas um inimigo que tem de ser eliminado.
É aviltante que o governo estimule e financie a ação de grupos que pedem abertamente restrições à liberdade de imprensa, propondo mecanismos autoritários de submissão de jornalistas e de empresas de comunicação às determinações de um partido político e de seus interesses.
É repugnante que essa mesma máquina oficial de publicidade tenha sido mobilizada para reescrever a História, procurando desmerecer o trabalho de brasileiros e brasileiras que construíram as bases da estabilidade econômica e política, que tantos benefícios trouxeram ao nosso povo.
É um insulto à República que o Poder Legislativo seja tratado como mera extensão do Executivo, explicitando o intento de encabrestar o Senado. É deplorável que o mesmo Presidente lamente publicamente o fato de ter de se submeter às decisões do Poder Judiciário.
Cumpre-nos, pois, combater essa visão regressiva do processo político, que supõe que o poder conquistado nas urnas ou a popularidade de um líder lhe conferem licença para ignorar a Constituição e as leis. Propomos uma firme mobilização em favor de sua preservação, repudiando a ação daqueles que hoje usam de subterfúgios para solapá-las. É preciso brecar essa marcha para o autoritarismo.
Brasileiros erguem sua voz em defesa da Constituição, das instituições e da legalidade.
Não precisamos de soberanos com pretensões paternas, mas de democratas convictos.
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Para quem quiser assinar o Manifesto, é só clicar aqui.
26.9.10
15.9.10
8.9.10
Um país de doentes
De Dora Kramer, no Estadão de hoje. Sabem o pior? É que quem está infectado é incapaz de perceber o que vai abaixo. Ou se percebe, como acontece com muitos que conheço, faz de conta que não viu. O motivo? Incorporou o método do partido, ou tem o corpo cheio de uma cepa diferente do bicho. Vivemos numa psicose coletiva, e pelo resultados das pesquisas, ela se alastra. Na verdade, acho que cada vez mais gente percebe que pode sair ganhando com isso. Não coletivamente, é bom que fique claro.
Macunaíma
Só porque é popular uma pessoa pode escarnecer de todos, ignorar a lei, zombar da Justiça, enaltecer notórios malfeitores, afagar violentos ditadores, tomar para si a realização alheia, mentir e nunca dar um passo que não seja em proveito próprio?
Depende. Um artista não poderia, sequer ousaria fazer isso, pois a condenação da sociedade seria o começo do seu fim. Um político tampouco ousaria abrir tanto a guarda.
A menos que tivesse respaldo. Que só revelasse sua verdadeira face lentamente e ao mesmo tempo cooptasse os que poderiam repreendê-lo, tornando-os dependentes de seus projetos dos quais aos poucos se alijariam os críticos, por intimidação ou desistência.
A base de tudo seria a condescendência dos setores pensantes e falantes, consolidada por longo tempo.
Para compor a cena, oponentes tíbios, erráticos, excessivamente confiantes, covardes diante do adversário atrevido, eivados por ambições pessoais e sem direito a contar com aquele consenso benevolente que é de uso exclusivo dos representantes dos fracos, oprimidos e ignorantes.
O ambiente em que o presidente Luiz Inácio da Silva criou o personagem sem freios que faz o que bem entende e a quem tudo é permitido - abusar do poder, usar indevidamente a máquina pública, insultar, desmoralizar _ sem que ninguém se disponha ou consiga lhe pôr um paradeiro - não foi criado da noite para o dia.
Não é fruto de ato discricionário, não nasceu por geração espontânea nem se desenvolveu apenas por obra da fragilidade da oposição. É produto de uma criação coletiva.
Da tolerância de informados e bem formados que puseram atributos e instrumentos à disposição do deslumbramento, da bajulação e da opção pela indulgência. Gente que tem pudor de tudo, até de exigir que o presidente da República fale direito o idioma do País, mas não parece se importar de lidar com gente que não tem escrúpulo de nada.
Da esperteza dos arautos do atraso e dos trapaceiros da política que viram nessa aliança uma janela de oportunidade. A salvação que os tiraria do aperto no momento em que já estavam caminhando para o ostracismo. Foram todos ressuscitados e por isso são gratos.
Da ambição dos que vendem suas convicções (quando as têm) em troca de verbas do Estado, sejam sindicalistas, artistas, prefeitos ou vereadores.
Da covardia dos que se calam com medo das patrulhas.
Do despeito dos ressentidos.
Do complexo de culpa dos mal resolvidos.
Da torpeza dos oportunistas.
Da pusilanimidade dos neutros.
Da superioridade estudada dos cínicos.
Da falsa isenção dos preguiçosos.
Da preguiça dos irresponsáveis.
Lula não teria ido tão longe com a construção desse personagem que hoje assombra e indigna muitos dos que lhe faziam a corte, não fosse a permissividade geral.
Nada parece capaz de lhe impor limites. Se conseguir eleger a sucessora, vai distorcer a realidade e atuar como se presidente fosse. Se não conseguir, não deixará o próximo governo governar.
Agora, é sempre bom lembrar que só fará isso se o País deixar que faça, como deixou que se tornasse esse ser que extrapola.
Macunaíma
Só porque é popular uma pessoa pode escarnecer de todos, ignorar a lei, zombar da Justiça, enaltecer notórios malfeitores, afagar violentos ditadores, tomar para si a realização alheia, mentir e nunca dar um passo que não seja em proveito próprio?
Depende. Um artista não poderia, sequer ousaria fazer isso, pois a condenação da sociedade seria o começo do seu fim. Um político tampouco ousaria abrir tanto a guarda.
A menos que tivesse respaldo. Que só revelasse sua verdadeira face lentamente e ao mesmo tempo cooptasse os que poderiam repreendê-lo, tornando-os dependentes de seus projetos dos quais aos poucos se alijariam os críticos, por intimidação ou desistência.
A base de tudo seria a condescendência dos setores pensantes e falantes, consolidada por longo tempo.
Para compor a cena, oponentes tíbios, erráticos, excessivamente confiantes, covardes diante do adversário atrevido, eivados por ambições pessoais e sem direito a contar com aquele consenso benevolente que é de uso exclusivo dos representantes dos fracos, oprimidos e ignorantes.
O ambiente em que o presidente Luiz Inácio da Silva criou o personagem sem freios que faz o que bem entende e a quem tudo é permitido - abusar do poder, usar indevidamente a máquina pública, insultar, desmoralizar _ sem que ninguém se disponha ou consiga lhe pôr um paradeiro - não foi criado da noite para o dia.
Não é fruto de ato discricionário, não nasceu por geração espontânea nem se desenvolveu apenas por obra da fragilidade da oposição. É produto de uma criação coletiva.
Da tolerância de informados e bem formados que puseram atributos e instrumentos à disposição do deslumbramento, da bajulação e da opção pela indulgência. Gente que tem pudor de tudo, até de exigir que o presidente da República fale direito o idioma do País, mas não parece se importar de lidar com gente que não tem escrúpulo de nada.
Da esperteza dos arautos do atraso e dos trapaceiros da política que viram nessa aliança uma janela de oportunidade. A salvação que os tiraria do aperto no momento em que já estavam caminhando para o ostracismo. Foram todos ressuscitados e por isso são gratos.
Da ambição dos que vendem suas convicções (quando as têm) em troca de verbas do Estado, sejam sindicalistas, artistas, prefeitos ou vereadores.
Da covardia dos que se calam com medo das patrulhas.
Do despeito dos ressentidos.
Do complexo de culpa dos mal resolvidos.
Da torpeza dos oportunistas.
Da pusilanimidade dos neutros.
Da superioridade estudada dos cínicos.
Da falsa isenção dos preguiçosos.
Da preguiça dos irresponsáveis.
Lula não teria ido tão longe com a construção desse personagem que hoje assombra e indigna muitos dos que lhe faziam a corte, não fosse a permissividade geral.
Nada parece capaz de lhe impor limites. Se conseguir eleger a sucessora, vai distorcer a realidade e atuar como se presidente fosse. Se não conseguir, não deixará o próximo governo governar.
Agora, é sempre bom lembrar que só fará isso se o País deixar que faça, como deixou que se tornasse esse ser que extrapola.
7.9.10
4.9.10
A mentira, com um tanto de Dienpax
Até que ponto a mentira é sábia e necessária? Ao percorrer ensaios sobre ética que versem sobre esta forma de lidar com os conteúdos de nossa existência, é certo que um dos modos mais interessantes de colocar a questão, e respondê-la, é aquele que brota de uma posição mais lógica do que propriamente moral. A coisa toda pode ser expressa de uma maneira bem simples, que é mais ou menos assim: se todos decidirmos um belo dia começar a mentir ininterruptamente, uma espécie de caos se estabelecerá. Isso porque não haverá discurso que se que se religue a outros discursos ou ao que for, o que por si só descaracterizará a sua função. A linguagem entrará então no campo do desnecessário, e a convivência entre os homens irá se tornar algo relutante e puramente disforme. Nesse sentido, não há possível campo positivo para a resposta das questões que abrem o texto.
Um contraponto, porém, rapidamente nos aparece. - Mas essa é uma situação limite e generalizada - pode-se e deve-se argumentar -; isso não significa que a mentira não possa existir pontualmente, e por ser muitas das vezes mais encobridora do que propriamente uma inversora de discurso, tornar-se benéfica em dados momentos?
Hum: difícil a resposta. Pode ser que sim, claro. Mas até quando? E aqui a coisa se complica pois o discurso não provém de entidades metafísicas ou lingüísticas, mas é gerado por um sujeito que deve fazer com que todas as suas falas sejam plausíveis e sustentáveis. É muito fácil encontramos pessoas que digam: menti para preservar. Ou menti para evitar o sofrimento. Enfim, menti para fazer o bem. Mas e o que foi enganado, trapaceado pela mentira, irá se sentir de qual maneira ao saber o que a mentira acobertou, ainda que por um considerado bom motivo?
Duplamente traído. Sim. Claro. Óbvio. Traído pela mentira, a entidade moral-discursiva e, sabemos, psicológica, mas pior do que isso: traído por um agora mentiroso. Um ser de carne e osso, sendo que aquele que produziu o discurso já se encontra, ao aparecimento do novo enunciado, de figura alterada. Algo se interpôs entre ele e o restante de toda a sua história e de todas as suas relações: foi capaz de mentir por bem. Mas qual bem? Bem de quem? O que é um bem ante a uma descaracterização da realidade? Será esse um sujeito capaz de mentir por um mal? Mal de quem, e pra quem?
Um dos problemas da mentira é – boba e obviamente, como toda criança sabe - que um dia a verdade pode vir à tona. Mas o que a criança em nós também sabe mas não projeta a extensão é que o fato em seu aspecto bruto passa de moral também à pessoal. Tudo entra no redemoinho de desacertos que acaba, estranha e até risivelmente, parando no universo lógico dos parágrafos acima, criando uma versão humanamente maquinária do instituidor do problema: viramos robôs que podem ou não responder corretamente a questões, dúvidas e falar de nós mesmos. Mas quando será que falamos e respondemos corretamente? Ou será que de novo preservamos? Preservamos a quem, mesmo?
A mentira pode ser sábia e necessária tão somente quando ela se transforma enfim em verdade, e sabemos que isso é bem possível. Vivemos fazendo isso com nós mesmos, com nossa história reconstruída e encoberta por nossos desejos. Se assim não o for, se a passagem não for completa, a mentira criará no mínimo um possível... não confiável: aquele que atravessa seu desejo no do outro, às vezes no de si mesmo, desconfigurando o que está pela frente, seja por qual motivo ou intenção for.
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